Não é sempre que a gente se sente bonita. Essa é uma questão que estamos condicionadas desde sempre pelos padrões de beleza impossíveis que nos pressionam a alcançar.
Não tem nada a ver com a doença.
Mas é claro que hoje tem.
Eu vejo aí uma das maiores questões e transformações que a gente passa durante um tratamento de quimioterapia.
Pois é, pode parecer bobo ou muito menor do que o central que é matar o tumor.
Mas quando você se olha no espelho você se vê, se observa.
Não é fácil se olhar e não se enxergar mais ali pelos detalhes que os efeitos causam. O cabelo, a pele, o peso, tudo muda. É doloroso acompanhar algo mudar em si e que não depende de você.
É preciso se reconhecer e aceitar o momento.
Tão bonito escrever essas palavras, como se só de lê-las fosse como riscar isso da lista: feito! Há!
Nada disso. Posso dizer que estou no processo, que é muito longo e árduo, tão quanto aceitar o tratamento. Até porque não envolve somente a nossa aparência. Mudamos por completo.
Todos dizem que a autoestima é uma construção diária que envolve degraus (infinitos) a serem subidos. Anteriormente, é como se eu subisse um e estagnasse ou descesse dois de uma só vez. E repetisse o ciclo.
Com o início do tratamento, a sensação é de que fui jogada, de qualquer fosse o nível em que estivesse, e fui obrigada a começar tudo de novo. Degrau por degrau.
É exaustivo ter que lidar com toda uma realidade em que, independente de como você saia de casa, alguém vai reparar nas diferenças que você carrega. Se é um lenço ou uma peruca. Se é a carequinha ou o cabelo crescendo falhado (porque ele não cresce todo certinho!).
Desde o começo decidi ignorar qualquer tipo de olhar que recebesse — pena, compaixão, tanto faz. Entretanto, isso não fez com que eles não existissem. Ou que não tivessem algum impacto em mim.
O que aprendi até aqui é que por nada ser constante, nada é permanente. E é nisso que mantenho o pensamento quando tudo parece o maior pesadelo.
Pra responder minha própria pergunta: talvez. Não tenho como negar toda a bagagem e conhecimento que venho adquirindo tão rapidamente — essa jornada vai completar 3 meses (apesar da carga ser de anos). É bonito quando a gente se reencontra. Se percebe como quem gostaria de ser. Chegar até lá? Nem tanto.
Esse texto não tem um fim, porque essa não é uma questão resolvida — quem sabe um dia… Tento aproveitar os dias em que me sinto bem a ponto de me sentir bonita de novo, como nessa foto. Esse relato é um lembrete de que tem dias em que isso é possível, mesmo agora.
Pode ser que amanhã eu me sinta muito melhor ou como o carinha da marca de pipoca. Uma conquista por vez, né?
Ah, cabelinho, tô com saudade de reclamar de você! Volta logo!
*Este relato integra o projeto “Além do Câncer”, no qual a Barbara Popadiuk conta histórias, reflexões e desabafos de uma garota de 22 anos com câncer de mama. Barbara nasceu em Rio Negro, mas cresceu na Vila Nova, em Mafra. Ela é jornalista, formada pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) e mestranda em Jornalismo pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)